23.7.10

afundada-de-cu-no-sofá

ahah, que graça que eu tenho.
sentada, sozinha, na sala, quando os ponteiros se unem no vértice do relógio redondo, com um cigarro a arder no cinzeiro que é uma casca de coco e um MacBook no colo, e a litigar a humanidade.
mais uma vez, ahah.
estou a ouvir música (ou barulho como muitos lhe chamariam) de protesto, e a pensar "sim, realmente, é verdade, têm razão", e a ficar exactamente na mesma posição cómoda em que estou há coisa como quarenta minutos.
ahah. ahah.
o comodismo é uma coisa fabulástica.
o que não é uma coisa fabulástica é a resiliência dos dedos em não se soltarem do filtro do cigarro e juntarem-se às teclas outrora brancas do portátil.
mais uma vez, o comodismo.
a vontade de não pensar.
de enfiar o cu no sofá e ver filmes e séries televisivas degradantes, com o fiozinho de baba no canto da boca típico da criatura catatónica.
há umas semanas que tenho uma folha colada na parede do quarto e o material todo pronto para voltar a desenhar. mas chego à frente da folha e penso: "...naaah, não 'tou p'aí virada". e viro-me. e vou-me embora. e a folha e o material lá continuam, inertes.
há uns meses largos que ando a tentar voltar a escrever. monto tudo, computador ligado, cinzeiro ao lado do teclado, livros para consulta à beira da cadeira, ficheiro aberto, e... acendo um cigarro, encosto-me às costas da cadeira e lá fico. e a escrita fica exactamente onde estava há oito meses.
e é exactamente contra isto que eu "litigo".
o comodismo.
a pobreza de espírito.
mais uma vez, ahah.
dou por mim a pensar: "já não vou ver uma peça de teatro desde que fui ver A Mãe" e isto aconteceu em Março.
dou por mim a pensar: "já não leio um livro inteiro desde que li o Deuses Americanos" (g'anda livraço do Neil Gaiman, aconselho vivamente) e isto aconteceu em Novembro.
dou por mim a pensar: "já não vou ver uma exposição a sério desde... porra, desde quando?".
é este o cerne da questão, porra.
estou a transformar-me num dos grunhos que tanto repudio.
e estou a transformar-me nisso porque estou a perder a força de espírito, sou uma absoluta comodista e afundada-de-cu-no-sofá porque o resto dá muito trabalho.
e parece que por muito que tente tirar daqui o cu, ele arranja sempre maneira de para cá voltar.
mas o preocupante não sou eu, que basta ter um motivador (por mais pequeno que seja) para saltar de onde estou.
o preocupante são os meus pares, os da minha geração, os da geração anterior à minha, e os da geração a seguir à minha.
vou partilhar o mundo com um grupo de afundados-de-cu-no-sofá porque fazer seja o que for dá muito trabalho.
é certo, há outros que nem põem o cu no sofá porque são demasiado sóbrios para isso, mas, a verdade é que, a esmagadora maioria das pessoas é sempre como eu estou agora: afundada-de-cu-no-sofá.
ahah. que graça que eu tenho.

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