27.2.10

mãe terra

(sim, porque hoje estou num frenesim de escrita - W00T!)

ao jantar, poucas são as vezes em que estou realmente atenta às notícias que não se refiram a portugal (estou geralmente mais atenta ao outro lado da mesa, não vá eventualmente voar uma mão-cheia de chantilly para a minha cara).
mas nas ultimas semanas, tenho estado atenta, sim.
e penso.
estas catástrofes da Terra.
o Haiti.
numa escala mais pequena, a Madeira.
o Chile.
o Havai.
e tantas mais catástrofes das quais nem sonhamos.
quando foi do Tsunami no Sri Lanka, só sabia pensar "ahhh coitadiiiinhoooos".
agora só sei pensar "a seguir somos nós".
não, isto não é uma teoria persecutória - é a realidade.
foi exactamente durante o jantar de hoje que isso se me assimilou.
eu disse que isto que vemos é a Mãe Terra a fazer uma triagem - só os fortes sobreviverão.
e disse também que isto só acontece porque A estamos a destruir.
os meus pais, cépticos (o meu pai já nem tanto, creio que é um shaman em negação), disseram "isto é um ciclo", ao que o meu pai acrescentou "é como a minha psoríase - vai das fases".
(um aparte, o meu pai sofre de psoríase, uma doença de pele que lhe surgiu o ano passado e que se intensifica conforme os níveis de ansiedade)
ou seja, de acordo com a teoria do meu pai, que faz pleno sentido, a Terra está a viver um período de ansiedade.
creio que já chegou a um tal ponto que pura e simplesmente não tolera mais maus tratos.
e creio que é isto que andamos a pedir desde a Revolução Industrial.
para quem viu o filme "O Acontecimento", é exactamente isso que andamos a viver.
o mundo está a tomar conta de si, a proteger-se.
nesta altura, o mais que temos a fazer é ajudar quem pela Terra está a ser castigado, e cuidar a Terra também.
cuida a Mãe Terra, é dela que vieste e é para ela que irás.

o que faz?

na quinta-feira deparei-me com uma questão que até então sempre se me tinha assimilado óbvia.
um bom amigo meu estava apagado.
um gajo dos hip-hops, FYI.
um rapaz extremamente interessante, com boas ideias - e, no entanto, um céptico, um materialista de primeira, racionaliza o mundo para o poder compreender.
e, mais uma vez, ele estava apagado.
quando lhe disse isso, ele limitou-se a perguntar: "como assim?"
"estás apagado. os teus olhos não brilham."
"se os meus olhos não brilhassem, era sinal que estavam secos e que nesse caso estava profundamente desidratado."
a conversa seguiu, a um ritmo estranho.
por regra, as pessoas chamam-me de "gótica", embora tenha perfeita noção que não o sou.
o meu amigo disse-me: "sinto-me gótico."
"porque é que te sentes gótico?"
"porque estou com uns pensamentos super estranhos."
"tais como?"
"pensamentos de gótico. sangue. vazio. negro."
"não é nisso que um gótico pensa."
"não?"
"não. não é isso que faz dum gótico um gótico."
"então o que é faz dum gótico um gótico?"
e sempre se me assimilou óbvio - o gótico é aquele que é culto em literatura, música, história, por aí adiante. mas o meu amigo, um hip-hopper, também o é.
isso faz dele um gótico de boné branco?
o meu amigo também sabe falar sobre filosofia, política, música e respectiva produção, literatura de todas as épocas.
isso faz dele um gótico?
nesta altura, o meu amigo disse-me "conheço um gajo, do mais labrego que possas imaginar, que vive no alentejo, que é grande hip-hopper.".
um fulano que viva nas planícies alentejanas, de cajado na mão e de espiga de trigo entre os lábios, pode ser tão hip-hopper como um fulano que viva no grande porto, de boné na cabeça e calças pelos joelhos, pode ser gótico?
esta conversa foi há 3 dias.
e ainda me remói a cabeça.
será que hoje, nesta sociedade oca de valores e competências, o que determina o que uma pessoa é são as suas roupas?
os seus ornamentos?
o que é que faz de mim "gótica", então?
nesse caso não deveria ser hip-hopper também?

15.2.10

conforto

sentei-me na minha cama, de manga arregaçada, com o quarto a tremer ao som de violoncelos martirizados.
palpei pela minha gaveta à procura do meu conforto.
encontro-o e puxo-o.
fito-o, silenciosa.
ele está tão silencioso quanto eu, mas ri-se de mim, insano.
aproximo o fio da pele, mas a milímetros dela, páro.
páro e fico estática.
vejo as caras das pessoas que mais amo à frente dos meus olhos, e começo a tremer.
puxo o braço atrás, e olho-o.
olho-o como se nunca a tivesse visto.
olho-o como se no seu fio estivessem espelhados os olhares de desilusão.
olho-o e vejo nela uma cara pálida, sem expressão, morta.
tenho todas as razões do mundo e mais algumas para estar feliz.
será que já cheguei ao ponto de vício?
agarro um punhado de cabelo e ceifo-o, violenta.
isto não mais é tristeza, ou vazio.
é ódio, é repulsa a mim mesma, ao meu corpo, à minha fraqueza.
é esta a minha sina.